domingo, 22 de junho de 2014

Folha: Viúva do caos que não se confirmou torce por apito final


A Folha de S. Paulo, do empresário Otávio Frias Filho, publica, com uma semana de atraso, neste sábado (20/6) um editorial em que exalta o alto nível técnico da Copa e reconhece a boa organização do torneio, a despeito de falhas localizadas. Mas, como não poderia dar todo. Graço a torcer, o que incluíria mãos e cotovelos, o jornalão paulista dos Frias parece ainda acreditar em alguma catástrofe antes do apito afinal em 13 de julho no Maracanã. "Se o país pode se orgulhar da Copa que exibe ao mundo até agora, convém, como o próprio futebol ensina, esperar o apito final para cantar vitória –sobretudo em um torneio tão imprevisível quanto este", adverte Otávio Frias.  


1 *** Título: "Torneio de surpresas" ***

Resta saber surpresas para quem. O governo sempre acreditou no sucesso do Mundial. E desde o início a este se referiu, com certo ufanismo, como "A Copa das Copas". Surpresa apenas para os que desde 2012 teimaram em torcer contra, querendo assim politizar o maior evento do futebol mundial. Nesse caso, a Folha teve papel proeminente: sempre destacou qualquer notícia negativa, por menor ou inexpressiva que fosse, envolvendo a realização da Copa do Brasil.

2 *** Copa tem sido melhor que o previsto dentro e fora dos campos, com média elevada de gols e incidência localizada de problemas na organização ***

Há um quê de desolação e de frustração da Folha ao não reconhecer o óbvio que a imprensa mundial vem divulgando dia a dia: a Copa do Brasil não é apenas "melhor que o previsto", ela é a melhor Copa desde o distante mundial de 1958. E é insuperável em número de gols, que o diga os grandes selecionados que sofreram seguidas goleadas no Fonte Nova da Bahia! È sucesso de organização, a nota dissonante é uma torneira que não abriu na Arena da Baixada em Curitiba e duas cadeiras reclináveis que emperraram na Arena Amazônia. Esses são os problemas localizados? Sim, a tromba d'água que caiu sobre Natal em dia de Arena das Dunas lotado. A Folha deveria saber que o temperamental São Pedro não é, como Ronaldo, o oportunista de plantão, contratado da Fifa.

3 *** Já não faltavam motivos para a Copa do Mundo no Brasil ser celebrada como uma das mais empolgantes de todos os tempos, e o próprio presidente da Fifa, Joseph Blatter, afirmou nesta sexta-feira (20) que a qualidade do futebol apresentado na fase de grupos é a melhor da história. ***

A Folha investiu pesado em potencializar as frases contra a organização da Copa desferidas por Jerome Volcke, secretário-geral da Fifa, aquele burocrata que bem merecia um "pé no traseiro". Agora, tem de se curvar ante as falas otimistas do capo do futebol mundial Joseph Blatter. Os estádios estão, todos, absolutamente lotados. A farra é grande e o futebol de alto nível e com inusitadas goleadas. O que sobra de empolgação nos estádios e nos aeroportos, nas cidades-sedes e na mídia estrangeira falta em reconhecimento do êxito por parte da grande imprensa brasileira.

4 *** A média de gols na primeira rodada (3,06 por partida) é a maior desde 1958. Desde 1994, quando começa a série histórica do Datafolha, este Mundial teve o maior percentual de passes certos (86%) e os menores números de desarmes (216,6), faltas (26,6) e cartões amarelos (2,75) por jogo. Menos ênfase na destruição, mais na construção.  ***

Surtando nos números e nas estatísticas do futebol em Copas do Mundo, impressiona o desconforto da Folha e sua clara má vontade em não reconhecer o que torna essa copa "A Copa": bastaria retirar de seus olhos as traves político-ideológicas de sua esquizofrênica cobertura do evento e logo veria aqui no Brasil o mais bonito e moderno conjunto de estádios reunidos em um único país-sede de Copa em todos os tempos, com suas linhas arrojadas, características futuristas, beleza e estética insuperáveis; o conjunto de novos aeroportos, amplos, bem equipados, verdadeiros cartões-postais e as dezenas de obras de mobilidade humana de grande envergadura; além do preparo e a prontidão das forças de segurança inibindo - sempre dentro do marco legal - os black blocs mais assanhados nas 12 cidades que sediam esta Copa 2014.

5 *** Problemas localizados, é claro, ocorreram. Em Brasília e Fortaleza, formaram-se filas excessivamente grandes; em algumas arenas, torcedores notaram deficiências no sinal de telefonia e 3G; no jogo entre França e Honduras, uma falha no sistema de som impediu a execução dos hinos nacionais. ***

Se fosse editorialista da Folha sentiria imensa vergonha se tivesse de escrever o parágrafo acima. Falando sério, sistema de som falhando em transmitir hinos, filas grandes e deficiência de sinal de 3G - tais eventos podem mesmo ser alçados à categoria de "problemas localizados" em evento do porte de uma Copa do Mundo? Haja vontade de, qual Indiana Jones do jornalismo, querer encontrar o Santo Graal nas arquibancadas J da arena Pantanal!

6 *** Longe dos estádios, protestos relacionados à Copa felizmente provocaram poucos transtornos. As manifestações, como seria de esperar, têm atraído cada vez menos pessoas, embora ainda se verifiquem alguns confrontos violentos. *** 

A palavra deslocada nesse parágrafo. e que não fecha com o trabalho da Folha para inviabilizar a Copa do Brasil, é esta: 'felizmente". É óbvio que a Folha e suas companheiras de infortúnio com o estrondoso sucesso da Copa das Copas apostaram todas as fichas na ocorrência de protestos de monta, protestos com cenas de violência épica bem ao estilo Kill Bill, do mestre da pancadaria explícita Quentin Tarrantino. Mas não houveram. Agora sim, "felizmente".

7 *** Se o país pode se orgulhar da Copa que exibe ao mundo até agora, convém, como o próprio futebol ensina, esperar o apito final para cantar vitória –sobretudo em um torneio tão imprevisível quanto este. *** 

É assim que termina o editorial do jornal dos Frias. Deixa entrever que ainda apista na virada da Copa - ainda pode vir a ser o Mundial do Fim do Mundo, com muita violência, pancadaria, estádios desabando, aeroportos despencando, confrontos entre polícia e marginais mascarados gerando centenas de ferdos e de mortos. Afinal, escreve candidamente o editorialista da Folha: '... como o próprio futebol ensina, esperar o apito final para cantar vitória'.

Portanto, curtir o Mundial, respirar aliviado, torcer pelo Brasil mesmo... só quando soar o apito final. Esquizofrênicos é pouco. Mas aí a Copa já acabou. E vocês da grande imprensa perderam de goleada. O Brasil e seus 200.000.000 de cidadãos, seja ou não campeão, ganhou. E também de goleada.



Washington Araújo



Jornalista, escritor, professor da UnB, tem 17 livros sobre mídia e direitos humanos. Autor do blog de jornalismo e cultura Cidadaodomundo.org

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