quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

O passado de Elio Gaspari

A convocação para 2014: Eliooo, o Heitor!

Em coluna natalina, neste 25 de dezembro, o jornalista Elio Gaspari convoca protestos de rua para 2014. O panfleto está encartado na Folha e assemelhados.
Por Saul Leblon, da Carta Maior 
Em sua coluna natalina, neste  25 de dezembro de 2013, na Folha, o jornalista Elio Gaspari convoca protestos de rua para  2014.


É a sua explícita contribuição à campanha conservadora no próximo ano.



‘Em 2014 vem prá rua voce também’, diz o título da coluna que arremata com a seguinte exortação: ‘Em 2014 a turma que paga as contas irá às urnas. Elas poderão ser um bom corretivo, mas a experiência deste ano que está acabando mostra que surgiu outra forma de expressão, mais direta: "Vem pra rua você também".



Gaspari  engrossa o coro daqueles  que – a exemplo dele (leia a análise de Antonio Lassance, nesta pág),  sabem que só o impulso de acontecimentos anormais pode devolver o poder ao conservadorismo ao qual se filiam, nas eleições do próximo ano.



Reconheça-se no panfleto encartado na Folha o predicado da coerência:  Gaspari se mantém fiel  à cepa na qual foi cevado e graças a qual deixou o batente das redações para viver das memórias da ditadura.



O artigo é uma extensão dessa trajetória.



É como se o autor psicografasse vozes e agendas às quais serviu como uma tubulação expressa quando a ditadura militar agônica buscava erguer a ponte dos anos 80,  para trocar o uniforme pela gravata, sem macular a essência do poder.
Gaspari, sub-chefão de Veja, então, ao lado de Roberto Guzzo,   aderiu ao esforço de erguer linhas de passagem sem rupturas de destino.



Secretárias pressurosas emitiam a convocação em sustenidos de urgência pelos corredores da revista  nos anos 80: 'Eliiooooo, o Heitor, o Heitor!.



Era algo religioso.



O telefonema-chave chegava invariavelmente um ou dois dias antes do fechamento da edição semanal.



'Heitor', mais especificamente, o coronel Heitor Aquino Ferreira, acumulava credenciais do outro lado da linha .



Elas justificavam a ansiedade incontida no trinado das secretárias.



Sua ficha corrida incluía o engajamento, cadete ainda, na conspiração para derrubar Juscelino, em 1955; a ativa participação golpista para derrubar Jango, em 64; a prestação de serviços para injetar músculos no SNI; a ação lubrificante à passagem de Daniel Ludwig, o bilionário do projeto Jari, pelos corredores do poder militar. E assim por diante.



Com base nesse saldo foi nomeado secretário de dois ditadores: Geisel e Figueiredo.



Elio e Heitor tinham mais que a cumplicidade  na missão específica da travessia do quartel para a urna.



Fluxo e  vertedouro  identificavam-se num traço de caráter, digamos, olfativo: ambos eram bons farejadores dos ventos da história.



Elio começou a carreira  no jornal Novos Rumos, ligado ao partidão (PCB); rápido sentiu a friagem vinda do polo oposto   e foi servir ao colunista social e reacionário de carteirinha, Ibrain Sued; pós golpe, ascendeu como turbojato na carreira.



A pretensiosidade  é outro traço que dá liga à parceria.



Na conspiração golpista de 64, o capitão  Aquino Ferreira  usava um codinome afetado: 'Conde de Oeiras'.



Nos telefonemas ao jornalista Elio Gaspari  --destinatário dos pressurosos arrulhos das secretárias de Veja nos anos 80, o já coronel Heitor considerava desnecessário o anonimato.



Tampouco Elio recomendava discrição às telefonistas.



Eram tempos em que pertencer a certos círculos fazia bem ao currículo e ao ego.



Ser o mensageiro, a tubulação dos bastidores da ditadura dava prestígio e holerite.
Ademais de alimentar uma sensação de impunidade quase cínica.



Quando  os telefonemas  de Brasília agitavam as pautas e o arremate dos fechamentos de Veja, Heitor servia como homem de confiançae porta-voz  do general Golbery do Couto e Silva, chefe da Casa Civil do ditador Geisel.



Foi nessa condição de emissário e serviçal  que ele reuniu as famosas 40 pastas  de documentos  da ditadura, entregues entre 1982 e 1987 ao jornalista  amigo selando um troca-troca feito de  empatia e propósitos comuns.



Os arquivos serviriam de lastro aos livros que  Gaspari  lançaria com a sua versão sobre o ciclo da ditadura. 



Era essa a carga simbólica que  os chamados de Heitor propagavam pelos corredores da Veja, um ou dois dias antes do fechamento. Às vezes no mesmo dia; não raro mais de uma vez ao dia.



O destinatário  dos  telefonemas das sombras, a exemplo de outros protagonistas de um enredo  à espera de um filme, agora convoca as massas às ruas  em 2014.



De certa maneira, presta-se ainda ao papel de duto  de Heitor, já morto, psicografando  lições, limites e agendas  à democracia brasileira.



Teimosa, ela  insiste em afrontar  os perímetros sociais e econômicos  delimitados  nos anos 80, nos gloriosos dias da transição segura e gradual, abraçada pela dupla de democratas.



O artigo deste Natal carrega a ansiedade abusada de quem vê nas urnas de 2014 a última chance de reverter um processo no qual 'bruxos' de farda e megalomaníacos de redação perdem a prerrogativa de ditar o que é bom para o país e para a democracia;

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