segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

O salto na política e a interlocução no governo Dilma.



André Barrocal, da Carta Maior, faz uma análise sobre o estilo mais gerencial do governo Dilma, em contraste com a intensa participação política que havia no governo Lula.

 
Barrocal avalia que este estilo tem "potencial para virar um problema político e se voltar contra ela. Sem se considerar participante de um projeto coletivo, com o qual se identifique e no qual veja um pouco de si, a máquina tende a desanimar mais e a se mostrar menos disposta a defender o governo em debates públicos, entrevistas ou uma eventual crise".


A análise tem fundamento, e seria saudável o governo Dilma ampliar a interlocução e comunicação política com os setores descontentes. Mas também cabe compreender que parte dessa inflexão faz parte da evolução política brasileira, dentro da conjuntura herdada pelo governo Lula.

 
Será que Dilma não está radicalizando o conceito de poder executivo, como ele deve ser?


A rigor, o grosso da discussão política para o poder executivo deve ser na montagem do programa de governo proposto durante a campanha eleitoral e na discussão das prioridades no orçamento de cada ano. Uma vez eleito, o executivo precisa cumprir o programa de governo e executar o orçamento todo ano.
Dilma foi eleita com uma agenda política de continuidade. Já tinha o PAC2 formulado, e vários programas e projetos para executar. Ela já tem delegação para cumprir boa parte das metas nos 4 anos de mandato, sem grandes discussões políticas.

 
As discussões políticas que envolvem o executivo se reduzem a:

- ajustes no programa de governo;

- naturais correção de rumo naquilo que não está dando certo;

- novas iniciativas que surjam;

- a participação na gestão, através do provimento dos cargos.


O estilo que ela está seguindo guarda alguma semelhança com a do governo chinês. Lá há planejamento de longo prazo a cumprir, a Assembléia Popular Nacional (espécie de parlamento com delegados do povo) reúne-se uma vez por ano durante duas semanas e delibera o que o executivo fará. Daí em diante o que há a fazer é executar o que está planejado e deliberado.

 
Dilma pode se dedicar mais a executar do que articular politicamente, porque Lula deixou uma base governista montada, alguns pactos já definidos com movimentos sociais, e políticas públicas já maduras para serem executadas. Sobram alguns contenciosos com arestas para aparar.

 
Com o governo tendo uma agenda já deliberada para cumprir até o fim do mandato, sobra vontade de participação e formulação política, tanto nos movimentos sociais, como na militância partidária, sempre ansiosa por reformas e novas conquistas.


Então é hora de canalizar essa força política que está sobrando para o poder legislativo, mobilizando pelas reformas necessárias.

 
O Brasil dará um grande salto, se os partidos políticos brasileiros conseguirem amadurecer, a ponto atuarem fortemente em três frentes:

1) O poder executivo atual executa as deliberações políticas saídas das lutas do passado, e não das disputas do presente;

2) As questões do presente formulam o programa do próximo mandato;

3) As demandas por reformas que dependem de leis forem canalizadas para o Congresso Nacional, sem depender do executivo patrocinar;


 
E para conseguirmos isso, é desejável que o próprio governo Dilma amplie sua interlocução e comunicação com as bases políticas, de forma a evitar desânimo ou acirramento de ânimos por incompreensão do que o governo está fazendo. Com uma interlocução que assegure tranquilidade de que o rumo político traçado está sendo seguido, a canalização das forças políticas irá para reformas empacadas no Congresso, como a reforma política.



Segue a integra do artigo de André Barrocal da Carta Maior:


 


 
Depois de um ano de mandato, Dilma Rousseff reforça cobranças dentro e fora do governo por eficiência. Visão gerencial da presidenta faz subir cotação dos ministros Aloizio Mercadante (Educação) e Gleisi Hoffmann (Casa Civil). E leva setores da máquina pública identificados com lulismo a sentirem-se cada vez mais desconfortáveis com o que consideram despolitização.

 
Brasília – A presidenta Dilma Rousseff passou dois dias no Nordeste na semana passada vistoriando a transposição do rio São Francisco e a ferrovia Transnordestina, obras federais bilionárias. Durante o giro, aproveitou uma entrevista para avisar empreiteiros que tocam obras públicas. Daqui em diante, todas terão monitoramento sistemático e online pelo governo, metas serão cobradas, prazos deverão ser cumpridos. “Nós queremos obra controlada”, disse.

 
O recado ilustra como Dilma está cada vez mais obcecada pelo tema gestão, traço que carrega desde os tempos de “mãe do PAC”, o programa de obras do antecessor. Na primeira reunião ministerial do ano, em janeiro, Dilma já tinha alertado a própria tropa, sobre a importância crescente que dá à gerência. Cobrara a implantação de um novo sistema de acompanhamento de gastos, que permita “uma verdadeira reforma do Estado”, tornando-o “mais profissional e meritocrático”.

A fixação de Dilma por gestão foi a causa principal, segundo a reportagem apurou, da crise de hipertensão que mandou a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, ao hospital dias atrás. Atual “mãe do PAC”, que ajudara a supervisionar com Dilma quando ambas eram da Casa Civil de Lula, Miriam levou a responsabilidade junto para o novo cargo. Agora, vê a presidenta insatisfeita, pressionando-a por resultados e cogitando devolver a atribuição à Casa.

 
Mais do que na saúde, o reforço do enfoque gestor de Dilma impacta o espírito da máquina pública. Sobretudo em círculos mais lulistas. Em diversos escalões, sente-se falta de debates internos sobre rumos e políticas públicas, de decisões colegiadas, da retórica polêmica do ex-presidente. Sente-se falta, em suma, de mais política, entendida como construção coletiva e negociada, que perde espaço à medida que a postura gerente avança.

 
“Esse é o nosso governo, mas é outro governo”, diz um secretário-executivo de ministério, cujo nome será preservado, como o de todos os personagens desta reportagem, para evitar embaraços.

É uma constatação evidente desde as primeiras horas do terceiro mandato presidencial petista, não raro acompanhada de solavancos cotidianos, como a suspensão inegociada de rotinas ou a desconfiança sobre lealdades. “Às vezes, somos tratados como oposição”, afirma um assessor governamental que frequenta o Palácio do Planalto desde Lula.

Certa vez, ainda em 2011, a reportagem perguntara a um ministro egresso da gestão Lula e que hoje não está mais no cargo, se o governo Dilma era muito diferente. “Nem me fale...”, respondera ele, sem hesitar, ar preocupado.

 
“Agora as decisões são tomadas só no gabinete do ministro. Às vezes, com o secretário-executivo”, aponta, como uma dessas diferenças, um dirigente de escalão intermediário de um ministério.

 
Impacto externo


Se mexe com o espírito da tropa, a postura distinta de Dilma não parecer causar problemas perante o público externo. Ao contrário. Ela ostenta hoje índices de popularidade superiores aos de Lula e FHC, quando os dois tinham o mesmo tempo de Presidência. E isso, apesar de já ter trocado sete ministros por denúncias de corrupção publicadas pela imprensa, simpática à atitude gerente da presidenta.

 
O estilo Dilma possui, contudo, potencial para virar um problema político e se voltar contra ela. Sem se considerar participante de um projeto coletivo, com o qual se identifique e no qual veja um pouco de si, a máquina tende a desanimar mais e a se mostrar menos disposta a defender o governo em debates públicos, entrevistas ou uma eventual crise.

Há o mesmo risco no Congresso, entre partidos e parlamentares aliados, também eles formadores de opinião. Depois de um ano de pouco contato com a presidenta, ao contrário do que acontecia nos tempos de Lula, ninguém duvida. Dilma não gosta de política, fica mais feliz e à vontade lendo relatórios em seu gabinete, do que em cima de palanques ou num tête-a-tête com políticos.

 
No início do mês, quando o Congresso reabriu depois de umas semanas de férias, um líder de partido governista observava o senador José Sarney (PMDB-AP) discursar para um plenário vazio e desatento, e comentou: “Veja isso. O presidente do Congresso está falando e ninguém ouve. Cadê a Dilma? Ela tinha de vir todo ano nessa sessão. Não vir é um sinal, quer dizer muito.”

 
É preciso registrar, entretanto, que é costume o presidente da República mandar ao Congresso, na volta do recesso, seu chefe da Casa Civil levar o documento com as prioridades do governo. E foi isso que Dilma fez, ao despachar a ministra Gleisi Hoffmann, de quem a presidenta espera cada vez mais que funcione como ela, Dilma, funcionou para Lula durante cinco anos.

 
Segundo um assessor governamental, a postura gerente de Dilma tende a fazer de Gleisi uma peça política cada vez mais importante, como teria ficado demonstrado na reunião ministerial de janeiro, em que a presidenta emitiu sinais de que a auxiliar de Palácio do Planalto “cresceu”.

 
Até agora, o grande ganhador político da tropa dilmista é o ex-senador Aloizio Mercadante. Dias antes de tirá-lo da Ciência e Tecnologia para botá-lo na Educação, mas já tendo anunciado a decisão de fazê-lo, Dilma viajara ao Rio de Janeiro. Em conversa com o governador Sérgio Cabral (PMDB), ouvira uma pergunta sobre o motivo da mudança. “O Mercadante é a maior revelação do meu governo”, respondera Dilma, segundo relato de uma testemunha.

 
Na própria posse do ministro, Dilma revelaria a razão de o auxiliar estar em alta. “O ministro Mercadante é um excelente gestor”, afirmou a presidenta, para quem este era um “talento escondido” do ex-senador petista.

 
O incômodo do Congresso com a postura mais técnica de Dilma não deve, porém, produzir efeitos neste ano de eleições municipais. Segundo o líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA), a eleição deve gerar colaboracionismo entre parlamentares e governo, porque os primeiros terão interesse de contribuir para a realização de investimentos nos municípios, o que ajudaria o grupo político deles.

 
Entre os chamados movimentos sociais, igualmente formadores de opinião, existe a mesma ameaça de que a sensação de despolitização geral do governo, patrocinada por Dilma, se volte contra a presidenta.

 
Não por acaso, a presidenta começou 2012 reconhecendo que "exagerou" com os movimentos, ao manter-se distante deles no ano passado, e agora tentativas de reaproximação, como fez ao topar se sentar com um grupo grande de movimentos para discutir com eles a Rio+20, a Conferência das ONU sobre Desenvolvimento Sustentável.Os Amigos do Presidente Lula

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