sábado, 19 de novembro de 2011

Lama começa a aparecer

Será possível que ninguém do Ministério Púbico vê isso?

Lama começa a aparecer

Vem de longe o controle do governo sobre a Assembleia (Foto: Antonio Cruz)       


A Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) tem 94 deputados, 3.000 funcionários e orçamento anual de R$ 660 milhões. Desfruta da conveniência da imprensa comercial – que costuma se indignar com denúncias de Brasília e blindar o governo paulista. A maioria dos parlamentares submete-se em silêncio ao comando do Palácio dos Bandeirantes, onde, desde 1995, a morada do chefe do Executivo é também um ninho tucano. Em troca de investimentos e apoios aos seus interesses eleitorais, deputados da base aliada mantêm o governador do estado livre de qualquer dor de cabeça.


A responsabilidade da Alesp não é pequena. Lá se discute e aprova o Orçamento do estado – R$ 140 bilhões em 2011 – e se deve fiscalizar sua correta aplicação. É onde são tratadas leis importantes para a sociedade, desde uma que poderia proibir a venda de porcarias de alto teor calórico em cantinas de escolas públicas até outras que autorizaram o governo a vender o patrimônio estratégico – como do setor elétrico, do Banespa e da Nossa Caixa, a concessão de estradas e ferrovias. É lá também que a transparência da gestão pública deveria ser garantida, porém é onde o governo sabe que denúncias e pedidos de instalação de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) serão varridos para baixo do tapete.


O domínio do Executivo na Casa combina as indicações a cargos públicos, o compartilhamento do poder regional e a administração da liberação de recursos provenientes das emendas parlamentares ao Orçamento do estado. A maioria governista, por sua vez, joga o jogo quase sempre sem ser incomodada pela imprensa, de modo que a agenda da Alesp pouco repercute na opinião pública. Quantas vezes você leu, ouviu ou viu notícias de que os deputados paulistas investigaram uma suspeita de superfaturamento em contratos do Metrô ou de abusos da Polícia Militar – seja na forma violenta como age na USP, seja como persegue pobres na periferia ou reprime movimentos sociais?


Falhas no gerenciamento dos partidos da base, porém, levaram alguns parlamentares do PTB – aliado dos tucanos no plano estadual desde sempre – a se incomodar com o governo Geraldo Alckmin. Em consequência do desprestígio e da redução de recursos repassados à Secretaria do Esporte, comandada pelos petebistas, o maior cacique do partido, Campos Machado (PTB), vinha em uma intensa investida contra o governo, cobrando constantemente mais atenção às questões levantadas pelo partido.


Balaio de repasses


 
Essas faíscas no relacionamento causaram descontentamento, até que o deputado Roque Barbiere (PTB), em seu sexto mandato, aborreceu-se e chutou o balde. Disse ter ficado “de saco cheio” com tantas irregularidades permeando o submundo da Alesp e, em uma entrevista ao site do jornal Folha da Região, de Araçatuba, em meados de setembro, criticou o funcionamento do sistema de emendas parlamentares. Afirmou que de 25% a 30% dos deputados “vendem” a cota de emendas a que têm direito todos os anos em troca de abocanhar parte dos recursos liberados. E assegurou, sem revelar nomes, que o governo Alckmin foi alertado sobre o fato.


O secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, deputado licenciado Bruno Covas, confirmou a existência do esquema em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, na qual chegou a citar o caso de um prefeito que ofereceu 10% de uma emenda no valor de R$ 50 mil, que garantiu não ter aceitado. Semanas depois, Covas foi convidado a dar explicações sobre o caso ao Conselho de Ética da Alesp. Mas não apareceu. Apenas enviou carta em que afirma que seu relato ao jornal seria uma situação hipotética e didática, usada em palestras, encontros e conversas “para afastar qualquer tentativa de abordagem inadequada”. No Ministério Público do Estado, o promotor Carlos Cardoso decidiu abrir inquérito para apurar o escândalo. Para ele, não pareceu ser apenas um exemplo didático.


No dia em que Bruno Covas deveria ter comparecido ao Conselho de Ética, um levantamento divulgado em seu site indicava que, somente em 2010, ano eleitoral, seu gabinete havia conseguido o repasse de R$ 9,5 milhões em emendas solicitadas para diversos municípios paulistas. O valor excede em quase cinco vezes o limite permitido a cada parlamentar – R$ 2 milhões anuais. Covas, o deputado estadual mais votado em outubro, com 239.150 votos, foi também o relator do Orçamento geral do estado para 2011. Procurado, não falou com a reportagem. Desde a entrevista, não traz explicações sobre o assunto. Por meio de sua assessoria, justificou que o levantamento trouxe emendas de anos anteriores, pagas somente em 2010, e outras obras eram pedidos do governo, e não dele. E que deseja evitar o uso político do episódio.Continue lendo

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