quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Prévias partidárias

Marcos Coimbra

Correio Braziliense - 17/08/2011

As prévias partidárias voltaram com força à discussão política.


Primeiro, tivemos uma engraçada mudança de posição de algumas lideranças tucanas que, de adversárias intransigentes de sua adoção, passaram a defendê-las. Depois, foi a vez do PT, onde quem sempre as apoiou se tornou cético em relação às vantagens de tê-las.


No PSDB, tudo começou nas movimentações que antecederam à convenção nacional que o partido promoveu em maio. Apesar das tentativas algo patéticas do ex-governador de São Paulo José Serra, que lutava para preservar um mínimo de espaço brigando para ser nomeado para algum posto importante na estrutura partidária, estava claro que o aecismo venceria.


Como prêmio de consolação, destinaram-lhe um cargo sem função, de "presidente do Conselho Político" do PSDB. Era tão insignificante que, quando, recentemente, quis se manifestar nessa qualidade — diga-se de passagem, de maneira tão equivocada que embaraçou seus companheiros —, teve que recorrer a seu blog pessoal. A tal presidência nem sequer tinha um canal de expressão.


Para acalmá-lo, o outro gesto da liderança tucana foi acenar com a adoção de prévias no processo de escolha do candidato a presidente nas eleições de 2014. Mostrando que a disposição era sincera, o senador Alvaro Dias (PSDB-PR) chegou a preparar uma proposta de alteração da legislação que regula as campanhas políticas, de forma a permiti-las, sem incorrer nas penalidades hoje previstas.


O problema está em um dos conceitos mais sem sentido que temos, o de "campanha antecipada". Embora todos saibamos ser inteiramente ficcional o dispositivo que estabelece que as campanhas só podem começar depois das convenções partidárias e da homologação das candidaturas — que acontece na primeira semana de julho —, ninguém pode agir como candidato antes, sem enfrentar aborrecimentos, pedidos de impugnação e multas.


Ano passado, para coibir a movimentação de Lula em favor de Dilma, o PSDB — com os demais partidos de oposição — usou várias vezes seu direito de buscar a Justiça. É lógico, portanto, que pensasse em mudar a lei para as próximas.


Não existe, formalmente, nada que impeça as prévias na legislação atual. O próprio PSDB, em 2009, consultou o TSE a respeito e recebeu a resposta de que podia fazê-las entre seus filiados, desde que não atingissem o conjunto do eleitorado. Ou seja, podia realizá-las, mas sem que pudessem ser configuradas como "campanha antecipada".


O que a legislação permite é um processo interno de seleção, restrito a filiados devidamente identificados, fora dos meios de comunicação de massa, sem eventos públicos e participação popular. Nada a ver, portanto, com as eleições primárias, que existem em muitos países democráticos maduros. Se quisermos, parecido, no máximo, com os "caucus" norte-americanos, onde os membros ativos de cada partido se encontram para deliberar e escolher candidatos, característicos dos primórdios da democracia por lá.


Na proposta de Alvaro Dias — de agrado do serrismo — entre 1º de janeiro e o segundo domingo de junho do ano da eleição, "não constituirão infração eleitoral os pedidos de votos". Seria, assim, removida, pelo menos em parte, a camisa de força que constrange as campanhas no período. Subentende-se que chegariam à mídia de massa, ainda que seja cedo para imaginar em que a proposta poderia dar, supondo que viesse a ser aprovada, o que parece incerto.


O extraordinário no caso é a completa reviravolta das convicções de Serra e seus aliados. Para quem não se lembra, o PSDB só não fez prévias em 2009 para decidir a respeito das candidaturas na eleição de 2010, porque esse grupo não permitiu. Bem que Aécio tentou.


Os serristas diziam-se contra pelas mesmíssimas razões invocadas por alguns petistas, hoje, para achar que são inconvenientes na escolha do candidato do partido na eleição de prefeito de São Paulo ano que vem. Para não "dividir o partido", não "expor suas entranhas", não "dar argumentos à oposição", melhor decidir em privado, a portas fechadas. Melhor deixar filiados e militantes fora.


E assim vamos. Quem era contra, está favor, e quem desgostava, agora simpatiza. Quem sabia das coisas era Magalhães Pinto, quando falava da política e das nuvens. Não há nada tão mutável quanto as duas.

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