quarta-feira, 20 de julho de 2011

Rupert Murdoch e os latifúndios midiáticos


Aficcionado pelos escândalos com os quais fez uma fortuna, o magnata Rupert Murdoch está no centro de uma tormenta de grande magnitude. Seu império mídiático na Grã-Bretanha está cambaleando, depois que foram divulgadas as práticas de espionagens telefônicas em seu semanário News of the World, com mais de 7 milhões de leitores. Uma investigação do jornal The Guardian lhe proporcionou um golpe inesperado.


Por Luis Hernández Navarro, em La Jornada


O News of the World espionou 4 mil pessoas. Membros da família real, políticos e celebridades foram vigiadas ilegalmente pelo semanário. A Scotland Yard sabia e ignorou. A publicação subornou vários policiais.

Para conter os danos, Murdoch publicou, no sábado passado, em todos os seus jornais de alcance nacional, um anúncio de página inteira intitulado "Pedimos desculpas", fechou o News of the World, demitiu dois altos executivos da empresa que editava o tabloide dominical, hoje se apresentará à Comissão de Cultura da Câmara dos Comuns, e retirou sua oferta para adquirir 61% da British Sky Broadcasting, com o que teria obtido o controle total da empresa que domina o mercado de televisão digital no Reino Unido.

Rupert Murdoch é uma espécie de Cidadão Kane, protagonista do célebre filme de Orson Welles inspirado na biografia do empresário da imprensa William Randolph Hearst. Como mostra Michael Wolff, em seu livro The man who owns the news, sua vida e seu império são um só. Nasceu na Austrália há 80 anos. Em 1986, foi nacionalizado norte-americano, com a ajuda do presidente Ronald Reagan, para poder se tornar proprietário de canais de televisão.

Nos Estados Unidos, as leis impedem que um estrangeiro amplie os seus investimentos no país acima de 2 bilhões de dólares. Quando os jornalistas lhe perguntaram o porquê de sua decisão, ele respondeu: "porque eu queria ser estadunidense e estou muito satisfeito e gratificado"

Murdoch é um dos homens mais ricos do mundo: mais de 32 bilhões de dólares. Acumulou esta riqueza forjando um império midiático, que possui canais de televisão, jornais, revistas, editoras e interesses no mundo do cinema e da internet em todo o mundo.

Ele começou sua aventura empresarial na sua Austrália natal, na década de 50, onde adquiriu mais de uma centena de publicações. No final dos anos 70, entrou na Grã-Bretanha e comprou quatro publicações relevantes: News of the World, The Sun, The Times e The Sunday Times. Em 1988, passou a ter o controle de 20% do capital do grupo Pearson, proprietário do Financial Times, adquiriu metade da The Economist e comprou 14% das ações da Reuters, mas depois se desfez delas.

Nos Estados Unidos, adquiriu o jornal The New York Post, a empresa Dow Jones, dona do Wall Street Journal, e canais de TV. Fundou em 1986, a Fox Broadcasting, proprietária dos estúdios 20th Century Fox, produtor de filmes como Star Wars e Titanic. Dez anos mais tarde, incursionou na TV a cabo com o poderoso Fox News.

A propriedade de tantos e tão importantes meios de comunicação lhe dá uma influência política imensa. Murdoch foi um jovem, com ideias progressistas, que rapidamente se converteu em um homem conservador. "Quando eu era um estudante da Universidade de Oxford, eu era um socialista idealista e tinha um busto de Lenin no meu quarto. Eu ainda sou um idealista, mas agora me sinto mais partidário do livre mercado que de qualquer outra coisa", disse.

Apoiou o governo de George W. Bush e a invasão do Iraque. "Não podemos voltar atrás agora, dando todo o Oriente Médio para Saddam. Acho que Bush está agindo de forma moral e correta, e eu acho que vai continuar com isso", disse ele. Em outra ocasião, sem qualquer pudor, advertiu: "A consequência mais importante [da guerra no Iraque] para a economia dos Estados Unidos ... serão de 20 dólares por barril de petróleo. É mais que qualquer redução de impostos em qualquer país."

Nos Estados Unidos, a Fox News deu ao Tea Party uma ampla divulgação das suas propostas políticas e de seus candidatos. Em 2006, apoiou a campanha de Hillary Clinton pela sua nomeação como candidato presidencial do Partido Democrata.

Os meios de comunicação de sua propriedade impulsionam uma agenda que difunde valores conservadores e neoliberais, bloqueia a informação sobre a mudança climática e promove sentimentos racistas contra os imigrantes, árabes e mulçumanos.

A biografia de Murdoch e seu império sintetiza as alterações operadas nas últimas três décadas na indústria do entretenimento: a criação de um oligopólio global, semelhante aos da indústria do petróleo e da automotiva. A propriedade dos meios de comunicação tem se concentrado cada vez mais em menos mãos, formando verdadeiros latifúndios midiáticos, muitos deles multinacionais.

Este processo de monopolização tem sido acompanhado pela fusão empresarial de várias atividades econômicas. A indústria editorial, a produção e distribuição de filmes, as salas de cinema e teatro, a imprensa escrita, as emissoras de televisão, as gravadoras, as agências de notícias, mas também as telecomunicações, tendem a ser controladas por um pequeno grupo de empresários e suas empresas.

O que acontece nos países de língua inglesa com Murdoch é semelhante ao que acontece no México com a Televisa. Esta empresa possui quatro canais de televisão (além de muitas de suas repetidoras), duas agências de notícias, teatros, um dos maiores grupos editoriais da América Latina - que publica edições mexicanas da Comopolitan e da Esquire -, estações de rádio e vários clubes de futebol. É proprietária de 5% da Univision, o principal canal de televisão em espanhol dos Estados Unidos.

Os programas da Televisa respondem por 70% das cotas de audiência e publicidade do mercado mexicano de televisão. Seus conteúdos são reproduzidos em toda a América Latina. A tentativa de Emilio Azcárrga Jean, seu maior acionista, de seguir o caminho do australiano e naturalizar-se norte-americano fracassou.

Latifúndios midiáticos, como os de Rupert Murdoch e da Televisa, debilitam a liberdade de informação e a democracia. Para restaurar a função da informação como um bem público é necessário derrubar as cercas (desses latifúndios).

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