quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Os mágicos cinco pontos que decidem a eleição presidencial


Feitas as contas do mais recente tracking Vox/Band/iG, a candidata do PT, Dilma Rousseff, teria 55% das intenções de votos válidos, ou seja, cinco pontos de folga para levar a eleição no primeiro turno. Desde que o brasileiro reconquistou o direito de votar para presidente, a eleição se decide pela falta ou excesso desses mágicos cinco pontos.

Em 1989, Fernando Collor ficou com 53% dos votos válidos no segundo turno. Fernando Henrique Cardoso ganhou em 1994 com 55% e foi reeleito com 53%. Lula ficou a menos de quatro pontos de ganhar no primeiro turno de 2002 e a menos de dois pontos percentuais da reeleição no primeiro turno de 2006. Agora, os mágicos cinco pontos vão decidir a vitória de Dilma Rousseff em 3 de outubro. Ou vão lhe dar uma passagem para o segundo turno em 31 de outubro contra o adversário do PSDB, José Serra — a menos que haja uma reviravolta nunca vista em relação às tendências de opinião e Marina Silva, do PV, surpreenda todo mundo.

A primeira vista, está aí um país coerentemente dividido, oscilando entre governo e oposição, entre PT e PSDB e sobretudo entre Lula e anti-Lula desde a redemocratização. De fato, nada regeu mais essas duas décadas de política do que a presença de Luiz Inácio Lula da Silva.

A coesão das forças anti-Lula foi elemento estabilizador de dois críticos anos da redemocratização: do processo de impeachment de Collor em setembro de 1992 ao lançamento do Plano Real, em julho de 1994, passando pelo plebiscito, que poderia mudar tanto a República quanto o presidencialismo, e o instável governo Itamar Franco. Se não houve espaço para aventuras golpistas é porque do outro lado havia Lula e seu capital de mais de 40% de votos válidos. Se o Plano Real foi o primeiro a dar certo depois de cinco tentativas anteriores de estabilização, é porque, entre outros motivos, a coesão política e empresarial se fazia necessária para evitar os riscos de uma vitória de Lula naquele ano.

Mas então chegou 2002 e os mágicos cinco pontos mudaram de lado e assim permanecem nessa eleição, sugerindo o mesmo e coerente corte. No anti-lulismo de 2002 e, sobretudo em 2006, houve quem traçasse um país separado entre Norte e Sul (especialmente Nordeste e São Paulo), pobres e ricos, periferia e centro, povo e elite, Bolsa-Família e carteira assinada. Nada mais ilusório.

Os mágicos cinco pontos não têm dono. Eles oscilam, em primeiro lugar, ao sabor de uma onda nacional capitaneada pelo discurso do que representa o novo. Em 1994, o novo era a estabilidade econômica trazida pelo Real. Em 1998, novo era o medo de perdê-la. Em 2002, o novo era a necessidade de redistribuir renda e provar o avanço institucional. A Carta ao Povo Brasileiro foi o símbolo dessa mudança e a clássica frase de Lula, de que “a esperança venceu o medo”, talvez seu diagnóstico.

Cinco pontos mágicos, que representam 10% do eleitorado porque o que soma para um é tirado do outro, são compostos também por pequenas circunstâncias locais. Em 1994, FHC se elegeu perdendo em dois Estados (um deles o Rio Grande do Sul que depois ficaria com Geraldo Alckmin e contra Lula no segundo turno de 2006). Quatro anos depois, a derrota se ampliou para 11 Estados, alguns de eleitorado grande, como Rio de Janeiro e Ceará. Sempre por causas diversas, como a quantidade de aposentados no Rio, após uma reforma previdenciária que taxou aposentadorias e pensões, ou a presença de Ciro Gomes na disputa, levando 34% do Ceará.

Vencendo em todos os Estados, menos em Alagoas, Lula fez 61,2% dos votos válidos do segundo turno contra José Serra em 2002. E perdendo em sete estados, incluindo São Paulo, fez 60,8% dos votos contra Geraldo Alckmin em 2006. A maior vantagem proporcional de Alckmin se deu em Roraima, onde o governo sofria o desgaste de apoiar a Reserva Raposa do Sol, que não dá votos.

A onipresença de Lula (com o seu oposto, o anti-Lula), a instituição do segundo turno e, depois, da reeleição, além da força dos dois principais partidos, PT e PSDB, deram ao Brasil essa face polarizada. Vista de longe, as duas metades são semelhantes como na sobreposição de imagens de gêmeos: social democrata, moderna, urbana, tolerante, democrática. E isso explica em grande parte o avanço institucional dos últimos anos.

Mas vista de perto, no detalhe do que motiva esses 10% do eleitorado a oscilar entre um ou outro lado, ela é mais complexa, dependente de fatores regionais, de lideranças locais, da capacidade de mobilização e convencimento de cada campanha ou candidato. Se houvesse uma regra geral para entender esse eleitorado flutuante, ela não estaria nos candidatos nem nos partidos. Mas no discurso desse “novo” que sempre vence. O Collor de 1989 era o novo da direita, contra nomes como Paulo Maluf ou Aureliano Chaves. E seu discurso representava isso pela proposta de abertura econômica e reforma do Estado. O Lula de 1989 era o novo da esquerda, contra nomes como Leonel Brizola ou partidos como o PCB. E o eleitor dessa velha esquerda foi às urnas na mesma semana em que o Muro de Berlim caiu.

O Brasil colhe agora a maior safra de notícias positivas vividas por uma geração que cresceu ou nasceu na chamada década perdida. O fato de que a eleição de 2010 ainda não esteja totalmente decidida mostra apenas a incerteza do que efetivamente representa o novo a partir do pós-Lula.CLARO QUE O NOVO É DILMA, AFINAL, É MULHER, GUERREIRA, HUMANA, SENSÍVEL.


Luciano Suassuna, no iG

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