segunda-feira, 20 de julho de 2009

WALTER CRONKITE E O JN

Publicada em:19/07/2009


Não tenho o hábito de assisir ao Jornal Nacional, por razões diversas, mas na última quinta-feira (17), quebrei o hábito e sentei-me diante da TV para ver como o noticiário brasileiro estava tratando a questão da nova gripe. E confesso que fiquei assustado com o tom das notícias sobre a doença. A mim me pareceu que as informações transmitiram muito mais pânico do que prestaram um serviço ao telespectador. Nos EUA, onde o número de pessoas afetadas pela doença é muito maior, não se vê nada parecido.

Para que o leitor não pense que estou exagerando, colhi algumas informações transmitidas naquela noite e que podem ser encontradas no site do JN:

- Não há diferença entre os sintomas da gripe comum e da nova gripe;

- As pessoas que tiverem febre acima de 38 graus, tosse e dificuldade de respirar devem buscar um médico ou o posto de saúde;

- Pessoas com doenças crônicas, crianças de até dois anos, grávidas e idosos são considerados como grupo de risco;

- Animais contaminados por virus humanos podem desenvolver um outro tipo de virus, mais forte, e voltar a contaminar o ser humano.

Não é preciso dizer que, no dia seguinte, filas intermináveis eram vistas nas portas de hospitais e postos de saúde, a ponto das autoridades da área pedirem calma e alertarem as pessoas de que essa corrida desesperada em busca de socorro médico poderia ter um efeito contrário, com pessoas saudáveis expostas ao contágio do virus.

É preciso muito cuidado com o tratamento da notícia num telejornal que carrega nos ombros a responsabilidade de ser o líder de audiência, quase uma bíblia para milhões de telespectadores. Não se trata aqui, de omitir ou adocicar a informação. No caso específico dessa edição do JN, foi só terror, nada que transmitisse um pouco de otimismo ou de esperança em relação ao tratamento da doença.

Um capítulo especial nesse comentário, é a atuação dos jornalistas/apresentadores. Naquela noite não estavam os titulares, mas se estivessem não faria diferença. É que, talvez por influência de nossa latinidade, os noticiaristas brasileiros se envolvem apaixonadamente com o conteúdo da informação. Interpretam a notícia com uma carga de dramaticidade que só faz aumentar o clima de insegurança de uma população naturalmente fragilizada e assustada.

Isso foi na quinta-feira. Na sexta, ainda meditava sobre isso, quando veio a notícia da morte de Walter Cronkite, o maior ícone do jornalismo televisivo dos Estados Unidos. E a comparação foi inevitável. Ele estava aposentado desde 1981, mas sua morte causou tal comoção no país que todos os canais de notícias interromperam seus programas e dedicaram horas de exibição de material de arquivo, além de entrevistas com políticos e outras personalidades, tudo com o objetivo de relembrar e enaltecer o trabalho de Cronkite.

Essa unamidade em torno do nome de Cronkite tem uma razão de ser. Ele está sendo respeitado e homenageado, e seu trabalho nunca será esquecido, porque ele conseguia transmitir tranquilidade aos telespectadores nos momentos difíceis, como nas guerras e grandes tragédias. Fez da notícia um elemento fundamental não para criar pânico, e sim para ajudar a salvar vidas em momentos de dificuldade.

A expressão “âncora” foi cunhada para descrever o papel de Cronkite que comandou as convenções nacionais democrática e republicana, em 1952, quando pela primeira vez a TV transmitiu esses eventos. Hoje nos EUA, todos os apresentadores de telejornais são chamados “âncoras”.

No Brasil, que pegou o bonde errado, inventaram que “âncora” era o apresentador que fazia comentários. O que é absolutamente contrário ao pensamento do verdadeiro e original “âncora”, Walter Cronkite, que disse certa vez numa entrevista ao The Christian Science Monitor: "Sou um apresentador, um transmissor de notícias, um anchorman, um editor, não um comentarista ou um analista. Não sinto nenhuma compulsão em ser um crítico ou uma fonte de opinião".

Walter Cronkite, que ficou conhecido como “o homem mais confiável da América”, morreu aos 92 anos e nunca se soube se era democrata ou republicano.
Eliakim Araújo, Direto da Redação.

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