quinta-feira, 9 de julho de 2009

Venezuela no Mercosul: integração pra valer!


09/07/2009


A Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado Federal realizará nesta quinta-feira nova audiência pública para debater o protocolo de adesão da República Bolivariana da Venezuela ao Mercosul.

Assinado em Caracas no dia 4 de julho de 2006, o protocolo já foi aprovado pelo Uruguai, Argentina e pela própria Câmara Federal, mas enfrenta dura resistência dos setores demos e tucanos incrustrados na Casa e visceralmente contrários à integração latino-americana, que têm se utilizado dos mais obtusos expedientes para inviabilizá-la.

Exemplo que beira o absurdo, quando se debate a perspectiva de aprofundamento da democracia em nosso Continente e um novo patamar de relações entre países e povos, é o convite feito aos conhecidos golpistas Leopoldo López, ex-prefeito do Município de Chacao entre 2000 e 2008, na região metropolitana de Caracas, e Gustavo Tovar-Arroyo, auto-proclamado "membro ativo de direitos humanos e um dos ideólogos do movimento estudantil venezuelano", para participar de um painel no Senado.

A ficha corrida de Leopoldo López fala por si: em 11 de abril de 2002, participou ativamente do golpe de Estado contra o presidente Hugo Chávez e compareceu ao Palácio de Miraflores para assinar o "decreto de posse" de Pedro Carmona - cujo "governo" durou dois dias. Entre outros feitos, foi um dos elementos que patrocinou o cerco à Embaixada de Cuba no país - que dava sustentação aos programas de saúde e erradicação do analfabetismo -, cortando água e luz da representação diplomática na capital venezuelana. Formado nos Estados Unidos, foi consultor econômico de Planejamento da antiga PDVSA entre 1996 e 1999, período em que a poderosa estatal de petróleo venezuelana foi dilapidada ao limite, com comprovada malversação de recursos públicos. Foi professor do Departamento de Economia da Universidade Católica Andrés Bello (UCAB), toca dos Chicago Boys, neoliberais e privatistas dos governos Carlos Andrés Pérez e Rafael Caldera. Atualmente se dedica à ala juvenil do Partido Primero Justicia, agrupamento financiado pela Fundação Nacional para a Democracia (NED), do Departamento de Estado americano. A NED foi criada em 1983, durante o governo de Ronald Reagan, para trabalhar em conjunto com a CIA.

O outro expoente da direita, também convidado pelo Senado, é Gustavo Arroyo, que se apresenta como advogado e jornalista. Autor do livro "Estudiantes por la Libertad", publicado em 2007 pela editora do jornal El Nacional, diario arquirreacionário e um dos bastiões da SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa), coordenadora de propaganda do imperialismo norte-americano, igualmente financiada pela CIA.

Diante disso, de que "movimento estudantil" estará falando? Obviamente não o que mantém relações com a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas ou com a União Nacional dos Estudantes (UNE), não os aguerridos jovens que lutam para construir uma sociedade mais fraterna, que se somaram aos mutirões e fizeram da Venezuela o segundo país livre do analfabetismo em nosso continente; não os que, favorecidos pelas centenas de milhares de novas vagas no ensino superior, apóiam as medidas em defesa do fortalecimento do ensino público, gratuito e de qualidade, mas os endinheirados da classe AA+, que não disfarçam sua aversão aos pobres e sua contrariedade diante dos inúmeros programas de inclusão adotados pelo governo bolivariano.

Daí a razão de descrever Hugo Chávez como um "tirano, militar golpista e assassino", para quem defende uma condenação internacional por crimes de lesa-humanidade, "conhecidos ou que ainda não tenham sido revelados".

Para não nos estendermos, vale lembrar que, do ponto de vista de classe, a Venezuela é atualmente o país onde os trabalhadores têm o maior salário mínimo do Continente, sendo - ao lado do Equador - quem mais avançou no combate às terceirizações e precarizações, garantindo direitos a quem antes vivia como numa terra sem lei.

Se do ponto de vista político, a medida é claramente imprescindível, economicamente é mais do que inadiável, como atesta o empresariado produtivo. Conforme dados divulgados pelo informativo da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Venezuela (Camarabv), no ano passado, as exportações brasileiras para o país vizinho superaram os US$ 5,5 bilhões, enquanto as nossas importações foram de US$ 538,5 milhões, fechando 2008 com saldo comercial 2,5 vezes superior ao obtido com os Estados Unidos. Entre janeiro e maio de 2009, as vendas foram de US$ 1,4 bilhão e as compras de US$ 147,8 milhão. O saldo comercial do Brasil com a Venezuela foi de US$ 1,26 bilhão, 13,5% do nosso saldo total.

De acordo com o Boletim de Comércio Exterior da FUNCEX, divulgado em maio, enquanto o índice de demanda externa efetiva caiu 26,8%, com os EUA, União Européia, Rússia e Coréia do Sul registrando as maiores retrações - devido à crise internacional -, apenas a Venezuela teve variação positiva: 9,5%.

Conforme avaliação da Camarabv, "há diversos setores nos quais os dois países continuarão aumentando seu intercâmbio, que tende a crescer com a entrada da Venezuela no Mercosul".

A recusa dos representantes parlamentares do sistema financeiro e das transnacionais em dar este passo decisivo para a integração latino-americana é compreensível mas injustificável, colocando a politicalha reacionária acima dos interesses sócio-econômicos brasileiros. Afinal, terão seu espaço reduzido com o avanço do papel dos Estados nacionais e dos instrumentos para o fortalecimento da soberania e da consciência, que vem derrotando sua mídia e avançando sobre a desinformação e a alienação.

Mais do que um desejo histórico acalentado por gerações que deram suas vidas por este novo tempo, libertando nações do jugo do colonialismo, e estreitando laços de amizade e solidariedade, esta é uma necessidade que não podemos desperdiçar.

Que o desprendimento de José Inácio de Abreu e Lima, general pernambucano que lutou ao lado de Simón Bolívar na guerra de independência, nos impulsione e abra caminhos contra o entulho e o atraso.

João Felício é secretário de Relações Internacionais da CUT e secretário Sindical Nacional do PT.

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