Sarney: sair não resolve, mas...

Celso Marcondes, CartaCapital

O assunto que não some. É evidente que a renúncia de Sarney não acaba com os desmandos no Senado. Como é evidente que a oposição lucra com sua queda. Como é evidente que o pano de fundo da crise é a eleição presidencial de 2010. Tudo isso é evidente. Tudo isso é evidente. Mas a situação dele na presidência da “instituição” está insustentável.

Como, há pouco tempo, ficou insustentável a de Renan Calheiros, a de Jader Barbalho, a de ACM. Todos caíram em meio a escândalos de 2001 para cá. Foram substituídos por outros colegas. E a história volta. Alguns senadores passaram por lá neste período sem sair pela porta dos fundos: Tião Viana, Garibaldi Alves, Ramez Tebet. Mas eles – e o primeiro é do PT - não mexeram em nada na estrutura da “Casa”: os ditos “atos secretos” (mais de 600), o empreguismo, a superlotação de funcionários, as diretorias “fantasmas”, o esquema de uso das passagens aéreas, o nepotismo disfarçado, o Agaciel. Podem não ter empregado cunhados e netos ou recebido o “auxílio-moradia” sem ter direito. Ou alocado correligionários em apartamentos reservados aos senadores, algumas das desfaçatezes que Sarney, comprovadamente, fez.

O fato é que Sarney “acrescentou um plus a mais adicional” ao modus operandi da “instituição”. E que tudo o que fez – ou que manteve do passado - , sabemos, veio à tona em função da luta política interna que vem de várias frentes: conflito entre grupos de empregados da “Casa”, ressentimentos dos seguidores de Tião Viana – que foi derrotado na disputa por Sarney -, a briga entre os principais partidos pela presidência em 2010. As denúncias surgiram, umas atrás das outras, a imprensa divulgou, às vezes ampliou, interpretou de acordo com seus interesses. Mas o caso cresceu tanto que não há mais condições de Sarney continuar “apegado ao cargo”, coisa que sua filha Roseana garantiu que ele não é.

Não, sua queda não vai resolver a crise. Como as quedas de ACM, Jader e Renan não resolveram. Se Marconi Perillo, do PSDB, o vice, assumir, sua ficha virá à tona de imediato. Daí se discute as hipóteses Garibaldi Alves (PMDB) ou Marco Maciel (DEM). Será que com uma saída consensual a guerra prosseguirá? Ou há tanta, mas tanta coisa para ser modificada no Senado, que não há santo (santo?) que resolva. Suplicy resolveria? Pedro Simon? Jarbas Vasconcelos? Marina Silva? Mercadante? Se Ulisses ou Tancredo fossem vivos, resolveriam?

O fato é que a crise do Senado é a crise de toda a estrutura do parlamento brasileiro. O Senado é só a bola da vez. Amanhã poderá ser a Câmara dos Deputados, depois de amanhã a Assembléia Legislativa de São Paulo, no sábado a Câmara Municipal de Santana do Parnaíba. A estrutura que possibilita o empreguismo, o nepotismo, os altos salários, as verbas de representação, as mordomias, a farra das passagens aéreas, tudo isso e muito mais, teria que vir abaixo. Mas como?

A bancada do PT pede seu afastamento temporário e em algumas horas volta atrás. Faz as contas, sabe que romper com Sarney pode significar romper com o PMDB e abrir o caminho para que este corra para os braços de Serra. Lula chamou o senador para uma conversa ao pé de ouvido, enfrentou a mídia e disse que o PSDB quer “ganhar no tapetão”. Mas também não dá para reduzir assim, o mundo não se resume à disputa Serra e Dilma.

É crise das boas. Não sei como sair dela, mas não fui eleito para isso. “Quem pariu Mateus, que o embale”, diz o ditado. Não fui eu, não foi você. Eles têm que resolver, não deram sangue, suor e lágrimas para serem eleitos? Podem começar tirando o Sarney e, logo depois, toda a sujeira que está debaixo do “tapetão”. Se não resolverem, às vezes, o povo entra em cena para resolver. Noutras vezes, não entra. Simplesmente sai de cena, vira as costas, vai cuidar da vida, nem ir votar vai. Triste.